segunda-feira, 21 de abril de 2008

os velhos e os blogs

Nunca foi diferente. As expressões podem variar de “no meu tempo” até a do velhinho de Macatuba, “meninos eu vi!” Irresponsabilidade cibernética ampliada, esta devia ser a figura jurídica para nos impedir de blogar. Os serviços cruzariam o RG ou o numero da previdência com a idade declarada na hora de criar um. Um sensor de tempo mediria a hesitação dos toques no teclado. Mesmo um antigo exímio dactilógrafo (a grafia é intencional) estranha um computador. Armar um velho com um blog é tão desestabilizador na busca de uma ciberconsciência quanto os sites de jogo e pornografia o são para crianças. Podemos falar sobre o quê e quando quisermos a partir da pressuposição de que seremos ouvidos por alguém. E isto é típico da senectude (a forma latina é uma gentileza do autor, obvia e primariamente, em causa própria). Para confirmar, converse antes de ser, você leitor, um interno, com um(a) atendente de casa de repouso. Depois não vale. As suas orelhas, literalmente o par de apêndices laterais da cabeça, estarão sempre a disposição. Mas não confunda isso com a função auditiva. Ela inexiste nesse caso. Se assim fosse, só seria possível obter esses profissionais por lei federal de recrutamento por tempo pré-estabelecido, como o serviço militar. Afinal, diz a expressão popular, ninguém merece. Não deixa de ser tentadora a hipótese terapêutica de colocar drogados jovens, em síndrome de abstinência, algemados a colunas nas áreas de convivência desses locais. Estatisticamente, a mais perigosa dessas manifestações é o redentorismo senil.

Enquanto refletia sobre isso fui colhido pelo caso Isabella que tanta comoção causa no momento. A coisa começou com um café num posto da rede Graal. Empunhando a comanda eletrônica estava por aproximar-me do caixa quando ouvi uma conversa entre duas caixas sobre o covarde e selvagem assassinato da menina. Pelo tom de certeza de uma delas, achei que seria interessante ouvir e retardei a passagem, mantendo-me próximo. Em rápida sucessão foram apontados quatro criminosos, a saber, a mãe, o pai, a madrasta e um quarto individuo não identificado, além de ser mencionado o avô, não cheguei a saber se materno ou paterno. Sem grau de culpabilidade definido, todos, sem exceção, tinham matado Isabella, o que me provocou uma imagem mental de um happening infanticída. Depois foi o álbum da UOL sobre o depoimento do pai e da madrasta da vítima onde o numero de fotos da imprensa no local, de si mesma, rivalizava com o de populares irados, e a matéria anexa que registrava os comportamentos desses mesmos populares. Delito à parte, foi a multidão que provocou a lembrança de Verri e Manzoni. O orgulho da mídia que constrói Colonne Infami com estatísticas de audiência, sempre antecipada e independentemente do resultado final das investigações. E o aspecto circense particulariza o crime como exclusividade de seus autores, permitindo que os cidadãos honrados possam continuar a fazer os seus pequenos furtos, serem corruptos, vagabundos, etc. No imaginário popular, o desejo de justiça é substituído pelo axioma pós-moderno “só existe crime se ao menos três emissoras de tv derem cobertura.” Um acanalhamento consentido da parte da oração que diz “...mas livra-nos do Mal. Amém!” Havia lá velhos que talvez dissessem “no meu tempo...” e também office boys, gente de todas as idades.

Justapostas as partes no editor de texto percebi que esse redentorismo vira-latas é inerente a condição humana, ou ao menos a grande parte dela. Independe de idade. É algo como a síndrome do TPS – Técnico Popular da Seleção, dos quais o Brasil tem algumas dezenas de milhões de portadores e para a qual não há vacina. Reformulo a proposta inicial.Talvez se deva permitir aos cibervelhos os seu blogs apenas colocando um pop-up anexo com a seguinte estória antiga:

“Na saída de um baile da terceira idade um grupo de senhores caminha alguns metros atrás de uma senhora quando esta é abordada e assaltada por três jovens. Observam parados enquanto um deles diz: - que absurdo! No meu tempo bastava um só deles pra fazer o serviço!”