domingo, 28 de outubro de 2007

Quão dissemelhante 3



Chegamos a Uberlândia na sexta, inicio da tarde, com as “precisas” indicações do dr Ortopedista famoso(localmente) de Caldas: Hospital Sta. Marta, Dr Zilbo, seu ex-professor. Sem rua, numero ou telefone. Ao pedirmos a informação em um posto de gasolina, os frentistas, a moça do caixa e o gerente, todos mobilizaram-se para localizar e nos indicar o caminho, dar o endereço e o telefone correto de lá: uma solidariedade que não existiu no médico que fez a indicação.

Hospital Santa Marta: desde a internação, rápida e sem problemas, até agora, domingo a noite, nenhum problema. O João, que o retirou do carro permanecendo ao seu lado até o apartamento, mostrou o astral do lugar rindo quando eu o informei que poderia soltar a cadeira de rodas porque o meu sogro não teria a menor chance de fugir com ela. A primeira surpresa foi que os apartamentos dão para uma varanda onde se pode fumar (ALELUIA!) sem ter que sair do edifício. Este fato já provocou-me uma inspiração mística: propor aoVaticano que Sta. Marta seja designada a patronessa dos fumantes hospitalares.

A segunda surpresa: o nome do ex-professor era Gildo e não Zilbo. Logo no primeiro contato ficou clara a segurança com que se poderia contar a partir de um dialogo franco, sem vaidade clinica ou marketing pessoal. Dr. Gildo Moacir de Souza é um daqueles raros profissionais para quem um extenso e brilhante currículo significa apenas o registro de uma vida profissional. Uma abertura para o dialogo continuado mostra a sua capacidade de reinventar-se a cada dia. Manteve a sua presença ao longo do sábado - cirurgia pela manhã e visita a tarde, embora fosse o dia do casamento da filha, a primeira a casar-se na família. Hoje, fez pessoalmente o curativo e avaliou o resultado. Dessa experiência fica uma paráfrase ao ditado nordestino sobre pais e filhos: “aluno só puxa o Mestre quando o Mestre é ceguinho!”

Uma estória engraçada: meu sogro já saira do centro cirúrgico para o R-X e eu estava na porta do apartamento esperando a sua volta quando passam duas técnicas de enfermagem (Rodislaine e Cristiane) e uma delas, Rodislaine, pergunta se o meu pai já chegou. Explico tratar-se do meu sogro e ela informa, com um sorriso inesquecível, ter deixado na maca um saquinho com a cabeça do fêmur em formol e pede que eu informe a enfermagem destinar-se o material não a nenhum tipo de exame, mas ao atendimento do pedido do paciente que pretendia colocá-la em uma feijoada.

Não sei o nome de todas as que cuidaram de meu sogro. As mais presentes foram a Ana Paula, a Maiene e a enfermeira Ivone. Nelas, e também em Rodislaine e Cristiane, assim como nas moças da copa e da limpeza que por lá passaram, o tríplice sinal da Deusa (Feminilidade, Força e Misericórdia) expresso em seus olhos e sorrisos. Que Ela continue a gerar, conduzir e abençoar as suas filhas!

sábado, 27 de outubro de 2007

Quão dissemelhante 2

De Caldas Novas a Uberlândia a viagem teve as suas estranhezas habituais.
Não deixa de ser simbólico o nome do hospital de destino: Santa Marta. Já que os médicos do N.S.Aparecida deram alta para o meu sogro desejando nos ver pelas costas como se fossemos todos leprosos – é assim que qualquer profissional incompetente reage a questionamentos, já notaram? – demos entrada num hospital que tem o nome (segundo João Evangelista) da irmã de Lázaro.
. . .
Duas coisas que só soube hoje:
o dr. Ortopedista (localmente) famoso de Caldas manteve o meu sogro desde a primeira queda até a saída do hospital após a segunda só com Lisador.
o dr. Fisioterapeuta foi quem vendeu a cadeira de banho cujas rodas quebram frequentemente: a ultima, voltando da fábrica, levou 4 metros de percurso para romper-se ( 6 testemunhas!).

Moral da história: familiar que questiona desestabiliza a mamata.

Amanhã conto mais, mas serão coisas boas, espero!

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Quão dissemelhante?

Cidadão brasileiro de 84 anos sofre queda na calçada a cinqüenta metros da residência. O estado de conservação das calçadas na cidade de Caldas Novas, Goiás convida a isso. Natural numa cidade onde o esporte predileto dos políticos nativos é a caça judicial ao prefeito em exercício. Eu disse caça mesmo. Já caçaram judicialmente 3, quase 1 por mês. Conduzido ao Hospital N.S.Aparecida passa por uma avaliação clínica e é enviado para casa onde fica sob medicação, para lesões musculares. Nova queda provocada por falha da perna afetada. O ortopedista que acompanha o caso mora no mesmo pequeno condomínio de 6 casas. A segunda queda é tratada sem que seja feita nenhuma radiografia e durante 18 dias provoca dores que obrigam o paciente a permanecer sentado em uma cadeira de rodas 24 horas por dia. Isso inclui fisioterapia feita por profissional habilitado do mesmo hospital que também nem ao menos suspeita de uma possível fratura. A situação obriga a procurar uma funcionária que cubra as necessidades de trabalho doméstico e tenha conhecimentos de enfermagem. Apenas admitida, essa pessoa apresentada por um casal vizinho e seguramente enviada por Deus pressiona o famoso (localmente) ortopedista para que seja feita uma verificação radiológica da lesão. Com a volta do paciente ao mesmo Hospital N.S.Aparecida o profissional o entrega a um colega mais jovem e a fratura de fêmur é constatada.

Iniciam-se as discussões sobre a necessidade de uma cirurgia sob a forma de junta médica. Introduz-se na história um ortopedista de Goiânia que informa os familiares que ele é um especialista e nenhum dos seus pacientes jamais precisou de UTI (que o hospital não tem, como não tem campainhas de emergência nos quartos e apartamentos) e também que ele fará a cirurgia lá mesmo. Informa ainda que está em Caldas Novas porque é feriado municipal em Goiânia (Lavoisier explica esta parte). Até então, como ele próprio declarou, ainda não havia visto as radiografias. Como havia controvérsia: o cardiologista e o anestesista julgavam ser um grande risco e os outros achavam que não, pede-se a anuência do paciente que, é claro, prefere não ter que ser removido para outra cidade. O doutor de Goiânia, questionado racionalmente por sente-se picado no seu orgulho (ou vaidade?) profissional (la garantia soy yo!) e decide não mais realizar a cirurgia por excesso de intromissão familiar – genro viúvo é família??? Mandam o paciente para casa e entre a alta e o pagamento da permanência, as faturas têm que serem refeitas três vezes por não suportarem conferencia e acabam decrescendo em cerca de 20% no total.

O encaminhamento é feito sob a forma de “declaração” e as chapas radiológicas não tem laudo. Amanhã, pela manhã,a vitima, digo paciente, partirá para Uberlândia onde, espera-se, será finalmente operado. Mais notícias desde Uberlândia em breve.

Memento: Uderzo e Goscinny já disseram através de um de seus personagens em”Asterix”: ...uma junta médica mata mais do que uma legião romana armada até os dentes!”

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Hay de todo...

passagem da Aeroflot, nos anos soviéticos de 1957
"Hay de todo en estes supermercado de Dios!" já dizia Manolito,
um personagem de Quino.
Pode-se dizer o mesmo deste blog.

domingo, 21 de outubro de 2007

Ruth


Oito meses hoje. Tirei dos guardados esta foto que fiz de você no mesmo ano (1982) em que um Gil sensível e lúcido, ainda não pasteurizado pela avidez do poder escreveu:
“... O verdadeiro amor é vão / Estende-se, infinito / Imenso monólito / Nossa arquitetura / Quem poderá fazer / Aquele amor morrer!...”
Gostávamos disso então. Creio nisso ainda!

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Arthur e a mesa

Foi ontem. num “Frango Assado” a margem da rodovia dos Bandeirantes. Parada para sanduíche e salgadinho. Consumido o salgadinho de espera do sanduíche uma sensação de perda de tempo causada exatamente...pela espera. Todos, ou ao menos parecia, estavam com a mesma premência de seguir viagem. Não sei se alguém mais ouviu quando o garoto com seu salgadinho pediu a mãe para sentar-se a uma mesa. Eu ouvi. E de pé junto ao balcão vi quando se dirigiram a ela. Num carrossel com velocidade de hd em busca que começava com o primeiro hambúrguer comido na lanchonete da então única Loja Americana, no centrão velho em SP (sentado em banquinho, no balcão) com todo o charme da novidade até o presente naquele momento desfilaram sanduíches, salgadinhos e lugares ao longo de mais de 40 anos. Da pré-fast food (por preparo) a super fast food (por consumo). Tão pouco tenho usado a minha mesa que ela acabou por converter-se em apoio de agenda, chaves e ocasionalmente de compras para serem desembaladas no dia seguinte. O garoto e sua mãe, a minha esquerda, comiam com a placidez dos que tem na refeição, qualquer que ela seja, um momento dignificante da condição humana. A pequena mesa alta e seus banquinhos convertidos em instrumentos de rito sagrado. Paz em meio ao barulho e a ansiedade. Meu sanduíche findo, eles ainda estavam lá. Aproximei-me, perguntei o nome do garoto: Arthur! Com tudo que me ia por dentro frente ao ensinamento contido numa frase dita por uma criança, mal consegui agradecê-lo. A percepção de por quantas formas podemos nos distanciar da condição humana ainda doía quando entrei no carro. Trabalhei todo o dia com o fato indo e voltando a memória. Cheguei tarde em casa. Tirei da geladeira uma torta salgada ganha no domingo de vizinhos muito queridos. Aqueci e comi – sentado – com garfo e faca, relegando o guardanapo de papel a sua função básica. Fui depois até as estantes e busca feita, retirei do envelope plástico em que o havia colocado o texto de “La dignità dell’uomo” (De hominis dignitate) de Giovanni Pico della Mirandola. Talvez seja o tempo de continuar o trabalho de tradução e notas a que me propus dez anos atrás e interrompi há quatro. Sabe Arthur, que o teu antecessor remoto e famoso não foi só o grande e trágico rei guerreiro de algumas versões da sua história. A sua criação, a Tavola Redonda, foi a base de todo o futuro código de honra da cavalaria medieval. Te agradeço e abençôo o exemplo dado. Que a tua vida seja longa e feliz e te permita tocar as vidas de muitos outros com a luminosidade com que tocaste a minha. Assim seja!

domingo, 14 de outubro de 2007

Pavarotti, Gigli e a Casa Verde

Tropeçar em alguém que neste ano de 2007 p.P. (pós-Pavarotti) entusiasme-se diante de um cd de Beniamino Gigli que ouviu na infância em 78 rpm, com os avós é uma dessas experiências raras que ensejam reflexões para além do fato em si. É verdade que o fórum da revista Panorama mostra bem que mesmo na Itália a figura do midiático cantor recentemente falecido nunca foi nenhuma unanimidade: há até quem o chame “Pavorotti”. Por outro lado, suponho que no imaginário de integrantes de Olodum a duplas sertanejas o sentimento de orfandade de expectativas foi imenso. Como Plácido gravou até hino de time de futebol, não percam as esperanças, mas Carreras não tem a mesma tolerância circense. A verdade é que o morto ilustre era um cantor pop com vozeirão, afastado há muito dos palcos sérios da ópera. Há tempos que Don Luciano só interpretava a si mesmo, como acontece neste nosso país com a cansativa e monolítica Fernanda Montenegro, ela com mais provincianismo e bem menos humor e graça.

O que causa uma certa tristeza pela não lembrança e alegria quando há com quem partilhar é a memória do Gigli. Um pouco de tempo em mecanismos de busca poderá dar aos mais jovens a dimensão deste, ele sim um verdadeiro Tenor. Voz, força interior e dignidade, espírito fraterno e magnitude natural deram a Beniamino Gigli (1890-1957) a difícil condição de suceder (e superar em certos aspectos) o não menos grande Enrico Caruso. É lamentável que uma observação dos que vieram depois dele tenha mostrado, Pavarotti incluso, que nos sobraram apenas figuras menores.

Nestes tempos de banalização que levaram Nessun dorma, de Turandot, até os programas de calouros, talvez valha a pena ouvir esse fragmento para fins comparativos através do link http://www.epdlp.com/opera.php?id=105

E a Casa Verde, onde entra?
A estória foi contada pelo Dr. C. G., de origem tcheca que a ouviu inúmeras vezes de seu pai, imigrante e marceneiro. Este senhor trabalhava numa das pequenas fábricas de móveis que até os anos ’50 ainda existiam no Bairro da Casa Verde, SP e morava proximo dali, no mesmo bairro. No final da jornada de trabalho costumava voltar para casa acompanhado por outro marceneiro, este italiano, filho único e solteirão que vivia com a mãe viúva, possessiva e irascível alguns quarteirões antes dele. Certa tarde, em 1958, ao chegarem a casa do italiano, o amigo e colega assiste a seguinte cena: um considerável numero de idosos estão dentro e fora dela, alguns em prantos. O italiano pergunta o que aconteceu na sua casa e lhe dizem que a sua mãe tinha morrido. Ele olha em volta, e como uma forma de libertação diz: “e vocês estão chorando por essa filha-da-puta? Vocês deveriam ter chorado quando morreu o Gigli!”

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Amanteigados



Esta postagem deveria ter sido feita antes, na serie “on the road”. Por uma bobeada do digitador ou por influencias cósmicas a foto escondeu-se até hoje (a segunda hipótese é mais charmosa). Assim vejo-me no dever de partilhar com vocês um aspecto da culinária serrana que apenas entrevi: os amanteigados.

Estes foram encontrados no Ponto dos Pães, na avenida principal de Urubici, uma pequena padaria onde também é feito um pão de milho colonial fantástico e completamente diferente, enquanto textura e sabor, dos que conhecemos em SP.

São do tipo capaz de alucinar um confeiteiro austríaco! Depois de degustar um, motivado pela necessidade de conceituação, comi o segundo. Daí a afirmação: são do tipo capaz de alucinar um confeiteiro austríaco! Este foi o meu primeiro contato com um universo a ser explorado “se a tanto me ajudarem o engenho e a arte”.

A estória é a seguinte: nos tempos da colonização da serra catarinense fazia parte das práticas domésticas a separação da manteiga do leite fresco. Donde ela era abundante mas oferecia os seus problemas para ser conservada. Por hábito europeu, o papel do pão na dieta rural era muito forte. Some-se a isso o bom senso típico das populações camponesas e essa manteiga passou a ser incorporada a vários elementos de longa conservação que faziam parte do dia-a-dia, principalmente as massas assadas. Quem me contou foi o padeiro, ele mesmo um serrano. Parece haver uma grande variedade de pães com essa denominação, amanteigados. Será uma agradável tarefa descobri-los.

sábado, 6 de outubro de 2007

Teimosia (parcialmente) recompensada

Após anos de insistencia junto aos japoneses do pastel-de-feira, pizzarias e demais usuários de azeitonas, tive a surpresa de ver a adoção da salutar e civilizada prática do uso da azeitona sem caroço na padaria Ceci em Moema,SP. Há cerca de 3 anos atrás dediquei bem meia hora a argumentação com um de seus donos sobre o assunto. Ainda tenho esperança, mas talvez seja mais fácil virar pastor evangélico. Em todo caso...Aleluia!

O escafandrista e a sexualidade



Nada é mais natural do que respirar. A Antiguidade, em sua lucidez pré-cristã, atribuía ao Ar (pneuma) a condição de elemento vivificador que, conforme alguns representava o próprio espírito divino presente na criação. A igreja nascente, ao criar a sua teologia sob medida, confunde “pneuma” com o espírito santo e o identifica com aquela pomba tão bem descrita por Fernando Pessoa, roubando-o definitivamente aos seus acólitos. Se não me engano, isso aconteceu no fatídico Concilio de Nicéia. Na falta de organização popular, não apareceu nenhum MSE – Movimento dos Sem Espírito. Que pena!

Em tempos de ecologia militante somos constantemente lembrados da importância da qualidade do ar para a Vida. Pois bem, supondo que do desmatamento a poluição tudo passa pelo ar que respiramos e sem o qual não viveríamos, podemos concordar que nada é mais natural do que respirar?

Se uma premissa comum é metade do dialogo, já a temos. Sou tentado pela paráfrase fácil: respirar é preciso, viver não é preciso. Tristemente fácil já que muitos são os que respiram e não vivem. Mas o ato natural de respirar tem a sua igualmente natural complexidade. Alem do básico e instintivo binômio inspirar-expirar, temos a respiração iogue, a dos nadadores, dos mergulhadores, dos músicos, dos que inflam balões em festas infantis, dos atiradores de zarabatana, dos cantores, dos ciclistas e dos sopradores de vidro, dos aniversariantes diante do bolo, dos arqueiros e atiradores com armas de fogo, dos atletas, dos fumantes e garçons, dos pássaros, peixes e plantas, etc. ad nauseam, mesmo sob uma severa generalização.

A cada situação corresponde um aprendizado e a necessidade de aperfeiçoamento. Sempre sob a égide da prática correta para um bom resultado. A leviandade é má conselheira e pode ser letal nessa questão tão profundamente natural. Cabe a cada ser humano perceber a sua própria necessidade respiratória e adequar-se a ela da maneira mais eficaz para os resultados pretendidos tendo em vista o prazer que pretendam auferir da sua atividade. Mesmo aquilo que chamei antes de “básico e instintivo binômio inspirar-expirar” pode significar prazer puro quando estamos nas vizinhanças de um campo de flores ou de um fogo operado com maestria. Diz a Tradição: toda verdadeira alegria vem do Paraíso!

Limitar esta função biológica sob qualquer justificativa dogmática é negar o direito a vida. Delimitar os seus fins e objetivos é arbitrariedade fascista. Arrogar-se o direito de aprovação da sua prática por terceiros é criminoso (lesa humanidade). Negar conhecimento ou ação que permita a qualquer ser vivo atingir a plenitude da sua expectativa respiratória é inominável. Colocar alguém num escafandro e lançá-lo a água é assassinato. Como se pode perceber, a minha visão do ato de respirar não pressupõe ensaio-e-erro além do natural, nem exclui o aprendizado consciente.

O motivo desta postagem foi uma acusação de irresponsabilidade (obviamente apoiada na velha desculpa de que não sei como é por não ter filhos) quando afirmei numa conversa com amigos que cabia aos pais de hoje prepararem os seus filhos para a sexualidade tornando-a algo tão natural quanto respirar. Sei que sou um dinossauro. Meu RG e o espelho ao barbear mantem-me rigorosamente informado. Mas nunca assumirei a patranha da cidadania com que tentam assassinar a Liberdade. Muitas foram as vezes em que renunciei a ela, mas sempre através do seu legítimo exercício – o livre-arbítrio. E sempre valeu a pena.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

On the road 5

A ultima fase da viagem foi sob chuva até a parada do ônibus em Rancho Queimado. De lá até Urubici foi diminuindo, deixando o asfalto e a vegetação molhados sob a uniformidade cinzenta do céu. Dia seguinte de sol pleno. Percorrer Urubici no arco solar pode ser uma experiência fascinante sob a ótica da luz. As montanhas mostram a sua aura quase como se, na sua condição de grandes iniciadas nos mistérios da natureza, desejassem lembrar aos humanos que mesmo quando o sol caminha para o Oeste ainda a luz brilha no Leste. Desta vez tive a sorte de conhecer mais a gente de lá. E sou grato por isso. Creio que esta viagem, na sua totalidade, foi uma viagem ao meu eu interior. Para ser honesto talvez deva contar que subindo a serra, tendo no banco ao lado apenas a mochila com a tralha eletronica e papel consegui finalmente chorar silenciosamente o que deveria ter feito há quase oito meses atrás. Talvez a montanha seja o único lugar onde o humano atinge a sua coerência dimensional. Abençoado seja "São" Kerouac.