quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Urban&cidade - pátria revisitada


 Confesso-me urbanóide. Tão urbanóide que extraio prazer visual de luzes de freio em dia de chuva. Mais ainda num contexto anacrônico de rede elétrica aérea. 
 E nas molduras formadas por arvores teimosas que disputam a verticalidade com postes tortos, totens esquecidos de uma modernidade finda com a primeira e verdadeira morte de Marinetti em 1920.
É do caos urbano que surge a dimensão da vida com a sua permanente necessidade de superação. Cadinho para fusão pensamento/praxis. A cidade, como o Deus antropomórfico, precisa do reconhecimento humano para existir. Sou urbanóide, sobretudo porque a cidade não odeia livros.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Um conto hassídico: Salomão e o Gato


Sentado à mesa onde costumava ensinar o Rabi Nachman (1) observava a incomum agitação de seus discípulos. Com a calma objetividade herdada da mãe sefardita italiana, infelizmente assimilada (2), percorreu com os olhos e ouvidos atentos os gestos angustiados e murmúrios parando num jovem que parecia querer gritar enquanto o olhava com a mão levantada. “Você sabe que não precisa pedir para ir ao banheiro” disse o santo homem enquanto pensava “espero que questo defficente (3) não pergunte qual o traço de concreto usado na construção do segundo Templo (4). Já foi difícil explicar que o RamBam (5) nunca usou o Via Voice da IBM (6) para escrever o Guia dos Perplexos”.

“Reb,Reb”, disse o jovem, “nós estamos chocados com o risco assumido pelo grande Salomão no episódio das duas mulheres e a criança que beirou a mais completa irresponsabilidade. Assim mostraram os nossos cálculos de probabilidades sobre os possíveis desdobramentos da sentença”

“Que merda!” (7) pensou o Rabi citando para si Tomás de Aquino. Inspirou longamente por três vezes e disse docemente: “Meus filhos, apenas um desinformado ou desocupado ou retardado poderia chamar nosso rei Salomão de irresponsável. Creio que vocês conseguiram avizinhar-se da perfeição ao unir estas três características sempre presentes num perfeito cretino.

A real história do grande rei diz respeito não a uma criança, mas a um gato. Não a duas mulheres mas a dois homens, um português e um lituano (8). A idéia de dividir o gato ao meio que parecia lógica a ambos o obrigou a enunciar a célebre frase “mas não cabe ao homem julgar sobre a Criação. Lancem o gato para o ar.” Foi quando o assustado felino, vendo-se livre, saltou pela janela do palácio indo abrigar-se nas cocheiras onde viveu feliz ao lado de uma charmosa gata persa até os tempos de Davi.  E já que vocês tem tempo para perder em calculo de probabilidades inúteis peguem baldes e vassouras e deixem esta yeshivá (9) brilhando porque ela pode ser um galinheiro, mas deve ser um galinheiro limpo!(10)

 (1) De onde? Não importa. Sempre há um Rabi Nachman numa historia hassídica.
(2) era das que diziam o maternal “eu te mato” italiano ao invés do suave “eu me mato” judaico.
(3) algumas expressões maternas permeavam o seu pensamento com uma certa freqüência.
(4)  um exemplo da famosa intuição do Rabi.
(5)  referencia a Moisés bem Maimon 1135/7 - 1204
(6)  programa que converte um ditado ao computador em texto.
(7) o Reb a considerava a expressão máxima e síntese da weltanschauung do Doctor Angelicus que não apenas não entendera o RamBam, mas não poderia ser de outra forma visto que nascera em Roccaseca e morrera em Fossanova, o que já era suficiente para arrasar qualquer um.
(8) quando perguntado sobre o por quê um português respondia o santo homem: “e porque um lituano?”
(9) escola rabínica
(10) o Reb demonstra uma humildade mosaica quando abandona a esperança de ser o Guia da sua geração ao perceber que daquele mato não sairia coelho.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

domingo, 19 de setembro de 2010

Utilidade (?) pública

Como  impedir que um cabide com camiseta deixe o varal
transformado em pipa sem linha

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Ecologia interior: sobre a folhatempo


A produção de folhastempo representa menos de 0,1 x (-1496825393)% das folhas produzidas pela natureza. Sua colheita (quase sempre unitária)  independe da estação do ano e é regida pelo estado de espírito do coletor. As folhastempo estão em extinção desde o aparecimento do modem e da inserção de mensagens subliminares contra a posse de papel o que fez com que toda uma geração ainda jovem abdicasse da posse e leitura de livros. Combater a produção de celulose tornou fashion a desertificação mental.

Para quem não conhece: a folhatempo destina-se a intercalação entre páginas de livros, agendas em papel ou deixadas em caixas de sapato ou presente velhas recheadas de guardados. Como os quipus andinos que guardavam a memória incaica, as folhastempo guardam memórias pessoais determinando com a precisão de um relógio atômico a ocorrência memorável e situando-a no seio da eternidade. Sua velocidade ao  “linkar” o momentum é superior a 2000 terabites com a vantagem de dispensar qualquer fonte de alimentação. Efeito colateral/função terapêutica - auxiliar da flexibilização afetivo-emocional.

Sugestão: Passe em um sebo e adquira um livro de tamanho médio, capa dura (se possível), com mais de 350 páginas sobre qualquer assunto (ele não importa para o fim em questão), o mais barato possível. Ofereça-o a um(a) amigo(a), filho(a), sobrinho(a) ou neto(a) explicando tratar-se de uma maquina de produção de folhastempo. Não esqueça de colocar a primeira folhatempo alusiva a data do presente. Se for o único livro na casa do destinatário, proponha deixa-lo sempre na horizontal com um peso em cima. Um tijolo, por exemplo.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Profecia?


Não vai demorar: ecopopulistas amparados em tiranetes de inspiração filocubana & bolivariana decretarão a “extirpação” das referencias Art Nouveau na cultura brasileira por “exotismo”. Plantas e arvores só as nativas!

Para reflexão: está na hora de separar ecologia de ecopopulismo.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Alta curtição ...

Veja muito mais do pictorialismo americano – seleções dos anos 1921 e 1922 clicando abaixo:

Pictorial Photography in America 1921

Pictorial Photography in America 1922

Uma terapia de desintoxicação nestes nossos tempos digitais. Valeu a pena não conseguir dormir por causa da tosse (sorte no azar dizia o meu compadre). 

Obs.: os arquivos (albuns) podem ser baixados gratuitamente graças ao Projeto Gutenberg com ficha técnica completa.



domingo, 12 de setembro de 2010

Choveu


Finalmente choveu. Chuva boa, intensa, com vento. Competente e alegre, achou meio de deixar um haiku no parabrisa do carro e grafismo no chão com a folha seca de um butiazeiro centenário.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Proposta de Sonho ...

Imaginem que um dia como hoje, todos os muros do planeta amanheceriam com uma pichação destas:
... pra vcs tambem!

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Quem pergunta ...

Dizem que quem pergunta quer saber. E foi assim que começou esta postagem. Uma pesquisa do Ygarapaba, um restaurante de Garopaba, SC. Mais do que um restaurante, o Ygarapaba é uma dessas ilhas de civilização onde o exercício do cotidiano ato da alimentação pode ser feito por aqui sem que tenhamos que enfrentar o imponderável. E o imponderável, nestes tempos em que os grandes chefs propõem a “suflerização” do alimento, é cada vez mais ameaçador.

Como um vírus que eclode em ambientes até então seguros, o Ygarapaba não conseguiu escapar da destruição conceitual da lasagna, fenômeno que no sul do estado, por onde tenho peregrinado, assume a forma de uma ação sistemática. As estatísticas permitem afirmar que Santa Catarina é o tumulo da lasagna e da lasanha.

Parece haver um complot – e a grafia visa acentuar a periculosidade da coisa – contra a presença fundamental da massa (sem ela é impossível a estratificação que caracteriza o prato) nesse monumento da cultura mediterrânea. Occhio! O que você vai encontrar sob o nome de “lasanha” é um lago denso de molho (caso da quatro queijos do Ygarapaba) ou, quase tão disseminada por aqui quanto o aipim, um impasto desagradável de frango desfiado com milho verde enlatado (tranqüilize-se, eles pelo menos abrem as latas) entre duas ou três folhas (maximo) quase transparentes de massa. O resultado é a previsível coisificação* do prato.


Proponho uma alternativa: sejam obrigados os produtores de lasanha, restaurantes, rotisserias, etc., a inscrever sob o seu anuncio o verso de Dante desta forma: “Lasanha - lasciate ogni speranza voi ch’entrate!**”

Em sua biografia do Conde de Sandwich** Woody Allen cita uma de suas anotações datadas do ano de 1738: “Estou convencido de que há uma perene realidade, alem de tudo o que o homem já realizou, na simples justaposição de alimentos. “

* refletir sobre a significação de “coisificação” enquanto “reificação” em V. Goldschimidt.
** Divina Comedia, Inferno, Canto III)
*** Woody Allen in Cuca Fundida, LP&M Editores, 1981

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

madeiraempedra


Voltando. Mudança não terminada. Conexão instável. Perto do fim tudo é antecedido por um “quase”. O reino do quase é uma forma de limbo. Uma percepção: mudança física casa/coisas é madeiraempedra / práxis&transmutação sem juízo de valores. Só o possível. Reflete na palavra e no pensamento. Vejo-me também quase.